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Concessões e PPPs precisam abrir as portas para startups

Valor Econômico


Paulo Dantas e Bianca Correia

Nos países de tradição europeia, como no caso do Brasil, presta-se o serviço público diretamente pelo Estado ou por meio de particulares, neste caso geralmente por meio de concessão. Apesar de não ser um instituto novo no Brasil, a concessão teve sua roupagem jurídica atual consolidada em 1995 por meio da Lei 8.987. No entanto, o regime ali adotado se mostrou insuficiente para as demandas de infraestrutura e serviços públicos de uma maneira geral, razão pela qual, em 2004, foram criadas outras duas modalidades, a concessão administrativa e a concessão patrocinada, que, em conjunto, receberam o nome de Parcerias Público Privadas (PPPs).

Paralelamente, há uma infinidade de soluções e aplicativos em desenvolvimento que prometem alterar de forma significativa o modo como os serviços públicos serão prestados, em especial nos centros urbanos, que, em 2030, já contarão com dois terços da população mundial. Para atender a essa demanda crescente, o tão falado conceito de cidades inteligentes, mais do que uma abstração, é uma necessidade para um futuro bem próximo.

Assim, frente a esse cenário de forte inovação tecnológica, a concessão comum e as PPPs podem se tornar instrumentos jurídicos capazes de criar novas oportunidades, tornando-se verdadeiros indutores na satisfação da demanda de prestação de serviços públicos em ambientes cada vez mais integrados e digitais.

Uma forma de concretização dessa ideia seria incentivar a participação de micro, pequenas e médias empresas nesse mercado, considerando a sua importância para a economia do país. Segundos dados do Sebrae, existem, no Brasil, 6,4 milhões de estabelecimentos comerciais, sendo que destes 99% são pequenas e médias empresas, que representam 52% dos empregos com carteira assinada no setor privado e cerca 27% do PIB. Se o mercado de concessões e PPPs se abrir para essas empresas, esses números tendem a crescer sensivelmente.

Startups, por exemplo, são parte desse rol de empresas que dificilmente teriam condições de participar e vencer uma licitação para concessão e ou PPP com as regras atualmente vigentes. Todavia, com o incentivo correto, são capazes de propor as mais diversas soluções para os problemas atuais, de forma que essa medida se revela não só importante, mas urgente.

A bem da verdade, não se trata exatamente de uma ideia original, pois a Diretiva 2014/23 da União Europeia propôs uma desburocratização das regras aplicáveis às concessões, com o objetivo de incentivar as pequenas e médias empresas (PMEs) a entrarem no mercado de concessões, por meio de “um quadro jurídico adequado, equilibrado e flexível para adjudicação das concessões, que garantirá o acesso efetivo e não discriminatório de todos os operadores econômicos da União ao mercado e a segurança jurídica, promovendo investimentos públicos em infraestruturas e serviços estratégicos para o cidadão”.

Esse fomento à inovação e à participação de pequenas e médias empresas, pela União Europeia, a partir de contratos de concessão – e aos contratos públicos de uma maneira geral – aderem aos anseios do momento e das próximas décadas, tendo em vista a predominância de diretrizes de crescimento inteligente, sustentável e inclusivo.

É certo que não são todos os projetos de concessão e PPPs que são capazes de comportar micro, pequenas e médias empresas, mas há setores que certamente podem ser incentivados. Um exemplo disso é o setor de iluminação pública, que tem os municípios como detentores dos ativos a serem explorados. Considerando que existem cerca de 6 mil municípios e milhares empresas de todas as dimensões, é viável o desenvolvimento de mecanismos capazes de adequar o porte de uns aos outros.

Outro exemplo é o de mobilidade urbana, com o crescente uso de métodos alternativos de transporte, como bicicletas e carros elétricos compartilhados, além de melhorias no tráfego de veículos e pessoas por meio de semáforos inteligentes. Há inúmeras soluções que estão em fase de desenvolvimento e que podem ser adaptadas ou desenvolvidas para a realidade local, mais próximas aos cidadãos.

Pequenas alterações na Lei de Concessões e/ou PPPs já poderiam surtir o efeito desejado, como, por exemplo:

A desburocratização do processo licitatório, em especial nos documentos relativos à habilitação jurídica, qualificação econômico-financeira e regularidade fiscal e trabalhista, de modo a permitir a participação de startups em sua fase embrionária; Novos critérios para o julgamento da licitação, levando em conta, por exemplo, o impacto social que determinada solução possa causar naquela localidade; Diminuição das exigências em relação às garantias a serem prestadas, seja para o parceiro privado, seja para o ente público, notadamente para as pequenas e médias empresas e municípios e Novas formas de obtenção de receita, seja diretamente pelo usuário final ou pelo ganho econômico que possa ser gerado à administração pública, além de tantas outras que poderão ser repensadas, se forem criadas efetivamente condições de inovação.

O desafio não é pequeno, porém, as mudanças já estão sendo sentidas em várias partes do globo e não deve ser diferente no Brasil. Essa conjuntura cria uma oportunidade para que o país exerça o seu poder de influência na América Latina e se torne um modelo para toda a região no desenvolvimento do que se conhece por cidades inteligentes, que, essencialmente, consiste na prestação de serviços públicos em espaços urbanos de forma mais inclusiva, dinâmica e sustentável a partir da utilização da tecnologia disponível.

Paulo Henrique Spirandeli Dantas é advogado especializado em Direito Administrativo e sócio do escritório CBSG.

Bianca Soares Silva Correia é advogada do CBSG especializada em Direito Administrativo

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